Para onde nos levas?

Era uma vez um rapaz que gostava de se meter em atalhos e em trabalhos. Não se sabe ao certo quando terá começado esta vocação, mas o facto é que, ao longo dos vinte e três anos em que o tenho acompanhado, foram já diversos os episódios que pude testemunhar.

Quando de carro, não há rua estreita, devidamente sinalizada como sendo estreita, que fique por explorar; não há rua inclinada, visivelmente inclinada, que fique por descer ou subir, os travões a chiar, o motor a rugir. Quando damos por ela, lá estamos a ter que recolher os espelhos retrovisores para conseguir passar ou então ficamos encravados numa esquina impossível de dobrar, a olhar para trás na esperança de o recuo ser possível.

Com a descoberta das caminhadas na montanha, toda uma nova panóplia de trilhos inexistentes se abriu. Para a memória, fica o longo percurso feito a olhar para o Castelo de Castro de Laboreiro, ali tão perto que até dava para ver os turistas e, no entanto, tão longe e impossível de alcançar. Foi o dia em que, já familiarizados com plantas cheias de picos, travámos conhecimento com plantas cheias de super-picos-gigantes-e-duros, o sangue a escorrer, a fome a apertar, a pele a assar e o miúdo para aguentar.

Este fim-de-semana, tivemos o privilégio de viver mais uma aventura sem saída. O caminho começou em Mareco, fácil e amplo, resguardado do Sol por belos carvalhos e pinheiros. Era de tal forma agradável, que a ideia de optar por outro trilho numa das bifurcações com que nos deparámos, nem nos passou pela cabeça. Afinal de contas, o rapaz tinha a lição estudada e sabia que era possível chegarmos a Ribeiro de Ossos. E lá fomos, felizes e contentes, em direção ao rio, onde pudemos mergulhar os pés numa água que tinha tanto de cristalina como de gelada.

Quando parecia que o trilho tinha chegado ao fim, por que não continuar? Afinal de contas, havia micro porções do terreno que pareciam já ter sido calcadas, um indício de que estávamos certamente no caminho certo. Foi assim que chegámos à parte mais emocionante da caminhada: numa zona em que o rio, com corrente forte, se torna assustador e onde a encosta, cada vez mais íngreme, nos parece desafiar a rebolar por ela abaixo, eis que, em todo o seu esplendor, surge o moinho da Casa do Frade, desta vez do outro lado da margem. Perante tal apogeu, não foi difícil convencer o rapaz que já chegava de descobertas e estava na altura de regressar.

O rapaz vai, certamente, continuar por atalhos e trabalhos. E nós vamos atrás dele, porque que valor tem uma vida sem emoção e histórias para recordar?

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